segunda-feira, 29 de março de 2010

Filhos da Corrupção # 01 - Prisioneira

FILHOS DA CORRUPÇÃO
Por Adriano Miossi


Introdução ao universo de Entai


Em um tempo imemorial, dois universos, VIRTUE e AVITAE, tinham chegado ao máximo de suas evoluções. Seus povos tinham se tornado uma única energia cósmica de quase total sabedoria. Mas para ambos faltava A RESPOSTA, o motivo de suas existências. Seus níveis de sabedoria eram tão altos que um poder cósmico maior foi à presença de cada um deles e fez A PROPOSTA:
“Vocês devem enviar, cada um, um exército constituído de almas ainda não nascidas e evoluídas para um mundo que criarei. Esse mundo se chamara Zênite. E nele seus exércitos combaterão cada qual lutando pela conquista de dez marcos de poder a serem definidos. O universo que tiver o exército que conseguir conquistar os dez marcos será vitorioso e receberá a resposta. E o universo derrotado deixará de existir.”
Os dois universos aceitaram a proposta e se uniram para criar o terceiro universo. Da união de Virtue e Avitae nasce ARTUEN. Nesse novo universo, surgiram seres de alma primitiva que estavam longe do nível de elevação de seus criadores.
Milhares de anos após a sua criação, Artuen começou a evoluir e as primeiras formas de vida começam a surgir. Mesmo primitivas essas formas de vida tinham almas. E, ao morrerem, essas almas iam para Zênite onde se enfrentavam pelos marcos de poder até morrerem e reencarnarem em Artuen como um novo ser, mais evoluído ou não.
Com o tempo, as almas de Artuen foram avançando até o ponto do surgimento dos primeiros seres racionais. Esses seres racionais eram perfeitos para a guerra que estava sendo travada em Zênite. Guerra esta que se estendia indefinidamente devido a um equilíbrio constante de forças. Basicamente, as almas puras e boas eram recrutadas para lutar ao lado de Virtue e as malévolas e serviam Avitae.
Devido ao equilíbrio, ambas as dimensões esperavam que algo diferente acontecesse em Artuen e que esse algo fosse um diferencial que favorecesse um dos dois universos.
O diferencial ocorre quando um ser humano do planeta Terra tem uma experiência a beira da morte e se torna um entai relembrando do período em que lutou em Zênite por Virtue. Esse ser humano foi chamado de “Cristo”. A lenda é confusa e não se sabe ao certo se esse foi realmente o primeiro entai. Existem fortes especulações que os entai começaram muito tempo antes de Cristo, mas devido a falta de provas e do conhecimento de entais mais velhos, a teoria do Cristo é aceita pela maioria. O primeiro virtuoso queria acabar com a guerra de Virtue e Avitae. Para isso começou a espalhar paz e harmonia por onde passava para tentar purificar o maior número de almas possível e com isso fortalecer os exércitos de Virtue. Avitae, sentindo-se em desvantagem, encontra um entai recém iluminado chamado “Judas” e com ele consegue pôr um fim no profeta de Virtue. Mas Judas se arrepende de sua traição e se torna inútil para Avitae.
Ambos enxergaram que o diferencial era a influência que deveriam exercer sobre os seres humanos do universo de Artuen. Só que não podiam influenciar diretamente, pois as almas tinham o direito do livre arbítrio. Como saída, iam influenciando os entais para espalharem suas virtudes e corrupções pela Terra.
Esses entais não eram humanos comuns, pois ao relembrarem o tempo em que guerreavam em Zênite, automaticamente manifestavam os incríveis poderes de batalha que utilizavam na guerra. Esses poderes vêm de Virtue ou Avitae e se manifestam nesse universo através da Aura de cada um dos entais. A aparência de um entai é igual à de um ser humano comum (exceção para alguns corrompidos e virtuosos), exceto pelas asas de pássaro (Virtue) ou insetos e morcegos (Avitae) que podem brotar de suas costas assim que desejaram. Essas asas devem ter relação com a aparência dos povos antigos de Virtue e Avitae.
Antigamente, os entais eram chamados de anjos (servos de Virtue) ou demônios (servos de Avitae) e exerciam suas influências das mais variadas formas.
Mas o universo de Artuen tinha evoluído e já não era uma simples criancinha passiva aos caprichos de seus pais. E, a partir do inconsciente dos povos de cada planeta, cria uma entidade de imenso poder chamada CRENÇA. Essa entidade tem um aspecto diferente e segue princípios diferentes em cada planeta e representa sempre a vontade da maioria dos seres racionais. Na terra e ela fez com que as pessoas do deixassem de acreditar em “anjos” e “demônios”, fazendo com que os humanos recuperassem o total livre arbítrio. E por um longo período, os seres humanos não mais se tornaram entais fazendo com que a guerra entre Virtue e Avitae voltasse a se equilibrar estaticamente.
Cem anos depois, a alma parecia ter evoluído um pouco mais. Algumas pessoas, aquelas que experimentavam uma experiência à beira da morte, surtassem com entorpecentes, encontrassem a iluminação espiritual ou que sofressem de perturbações mentais graves se tornavam entais. Os primeiros entais foram os mais desamparados de todos, pois tiveram que entender, sem enlouquecer, todo o conhecimento que haviam obtido. Esses primeiros entais começaram a encontrar na Terra artefatos de imenso poder enviados por Virtue e Avitae para que a guerra continuasse aqui em Artuen. Esses artefatos eram feitos no mundo de Téris e enviados para cá de forma desconhecida. Antes de Crença perceber os planos de Virtue e Avitae, ambas conseguiram enviar, cada quais dez mil artefatos que foram espalhados pela Terra à espera de futuros utilizadores.
Quando Crença percebeu o que estava acontecendo, automaticamente, ela impediu que mais artefatos fossem mandados.
Um milênio se passou depois disso e estamos no século 21. Muitos entais surgiram conforme o crescimento global. Estima-se que atualmente exista 1 entai para cada 10.000 habitantes.
A guerra mais importante entre Virtue e Avitae está sendo travada aqui na Terra. Por entais solitários ou que pertencem a alguma seita. A resolução do conflito aqui definirá quem será o vencedor em Zênite. Hora a balança pende para um lado, hora pende para outro. Mas uma definição se aproxima.

1 - Prisioneira


Normalmente seria difícil se sentir triste quando se está em um uma sala cor de rosa com papel de parede das Meninas Super Poderosas. Mesmo assim Beatriz chorava por não se lembrar o que exatamente tinha ocorrido para que ela chega-se naquele lugar. Ela tinha vagas lembranças sobre um homem de rosto desfigurado. Seus olhos frios, tortos e de cores desiguais. Lembrava o que tinha acontecido enquanto estava no parque de diversões. ELE estava lá! Ela se lembrava da presença dele mesmo que breve, mas isso parecia ter acontecido há anos atrás. Foi tudo tão estranho, rápido e violento. E agora que estava nessa sala ela preferiu desviar o pensamento dessas memórias, pois elas aumentavam ainda mais sua depressão. Mas lembrar o antes não explicava o agora.
De inconsciência ela passou para a consciência e tudo que viu foi àquelas paredes com sufocantes temas infantis. Não havia janelas e a única porta era ferro reforçado. Parecia uma porta de prisão de segurança máxima, só que pintada de rosa. Ela tentou abrir a porta, mas estava trancada. Se ela não fosse apenas uma moça de corpo mediano talvez ela conseguisse arrebentar a porta com um chute. A lâmpada fluorescente do teto iluminava demais e incomodava seus olhos. Ela pensou em quebrá-la usando uma das almofadas felpudas que se espalhavam pelo tapete cor de rosa da sala. Mas imaginou que se seu seqüestrador voltasse ela iria preferir encara-lo de frente com iluminação e não com sua visão debilitada.
Para sua surpresa nada acontecia. Ela batia na porta, gritava, berrava e nenhuma resposta era obtida. Talvez estivessem tentando deixa-la louca. Mas isso não funcionária. Ela já tinha passado por situações suficientes para enlouquecer qualquer um.
Há oito anos atrás, quando ela era apenas uma adolescente, foi atacada por uma gangue na frente de seu melhor amigo e quase morreu nesse ato de extrema violência. Essa experiência a fez transcender e ela acabou se tornando uma entai da tristeza. A partir desse dia sua vida nunca mais foi à mesma. Seu melhor amigo chamado Daniel também passou pela mesma experiência de quase-morte e também se tornou um entai. Juntos com outro amigo que descobriram também ser um entai, chamado Johny eles se uniram sob a tutoria de um experiente virtuoso do conhecimento chamado Gabriel e viveram as mais perigosas e inimagináveis aventuras na Terra e em outros mundos de nosso universo. Tudo isso culminou em um grande torneio, no melhor estilo dos antigos gladiadores romanos, onde o destino de toda Terra e até mesmo do próprio universo seria decidido pelos mais poderosos entais de nosso planeta. Nesse torneio Johny se sacrificou para que pudessem por o plano de derrotar o idealizador do mesmo: Drexler, o corrompido da loucura e general da Seita Shakan. No final o plano foi quase bem sucedido, pois Drexler se matou para não ser destruído permanentemente. Temporariamente seu mal estava contido. Depois desse dia ela nunca mais viu Daniel, pois Gabriel, antes de deixar de existir o havia incumbido de uma importante tarefa que o afastaria para sempre dela. Depois de tudo isso não era uma simples salinha que ia enlouquecê-la. Certamente que não.
Por longas horas ela se encolheu em um canto oposto a porta. Ficou agarrada a uma almofada e chorou baixinho, mas ia mantendo o controle. Sem muita noção do tempo tinha percebido que começava a sentir fome e frio. Fome por não conseguir lembrar da ultima coisa que tinha comido. Será que tinha sido sopa de legumes? Frio porque estava vestindo apenas uma calcinha e uma camisola de seda lilás. Apenas seus longos cabelos a ajudavam a se aquecer. Isso fazia com que seu sentimento de carência aumenta-se ainda mais.
Cansada de chorar e de tentar entender o que estava acontecendo ela caiu no sono. Ao acordar viu perto da porta um balde e uma bandeja com comida e água. O balde ela imaginou a utilidade quando percebeu que estava com vontade de urinar e a comida foi recebida sem animo mas com muita fome. A comida era um pouco de carne, pedaços de pão e alguns vegetais. Parecia ter sido preparado por alguém sem nenhuma habilidade culinária. Depois de comer percebeu que essa seria sua rotina por muito tempo. Podem chamar de intuição feminina.

Beatriz já tinha perdido a noção do tempo. Talvez já houvessem passado duas ou três semanas. Várias vezes ela tentou fingir estar dormindo para surpreender a pessoa que estava deixando-a cativa. Se ela pudesse apenas vê-lo ela o faria lamentar ter existido. Literalmente! Como uma corrompida do esquecimento ela tinha desenvolvido a capacidade de deprimir qualquer um fazendo com que o mesmo lembra-se de momentos dolorosos e paralisantes de suas vidas. Também podia abrir suas asas de borboleta e fascinar o alvo. Seja lá o que fizesse ela teria uma chance de fugir daquele lugar. Mas ela não tinha conseguido ficar acordada uma única vez! Ela já estava começando a suspeitar que talvez estivessem liberando algum tipo de gás do sono pela saída de ar que ficava em uma das paredes. Tinha que ser isso pensava! Porque a cada três dias que acordava ela parecia ter sido lavada! Alguém estava lhe dando banho enquanto dormia. A idéia de ter alguém tocando seu corpo nu simplesmente a deprimia ainda mais. Sentia-se um bichinho em uma jaula a mercê dos caprichos de um algoz desconhecido.
Ela pensou que seria interessante tampar a saída da ventilação com as almofadas. Começou a fazê-lo, mas lembrou que com isso não teria como respirar, pois a porta não tinha frestas, e parou desanimada. Plano idiota pensava consigo mesma. Mas colocando a mão na saída de ar percebeu que vinha uma brisa gelada pelo mesmo. Bom, se ela precisava de refrigeração era sinal que estava em um lugar quente ou até mesmo em um local subterrâneo que necessitava de ventilação.
Ficar pensando em uma forma de escapar fez com que ela se distraísse por algumas horas. Inevitavelmente ela se lembrou do fato simples que a atormentara: fugir de lá para que?
Beatriz tinha vivido os últimos sete anos usando a máscara amarela de uma amiga morta e jurado continuar o trabalho da mesma. Trabalho esse que a fazia caçar entais que abusavam de seus poderes nas ruas de São Paulo. Ela estava seguindo a loucura de outra pessoa. Uma forma de fugir da realidade. Isso estava funcionando até ela aparecer nesse maldito lugar e ser posta a rever toda sua vida novamente, e essa é a pior coisa que pode ocorrer com um corrompido da tristeza.
Ela começou a se lembrar de sua infância e dos abusos que sofrera de seu próprio pai. Lembrava-se de seus amigos de primário sendo torturados pelo mesmo em sua oficina. Pensava no dia em que havia sido adotada por um feliz casal, logo após a morte de seu pai. Seus pais adotivos a fizeram enxergar um mundo mais feliz. Sentia falta deles. Porém se sentia culpada por sentir mais falta de seu amigo Daniel. O que ele estaria fazendo? Não sabia a resposta para essa pergunta e dormiu pensando nela.

Ao acordar se sentia fraca. Fraca por ainda não ter tido uma boa idéia para sair de lá. Se tivesse o otimismo memorável de Daniel ou a coragem de Johny, certamente não estaria mais naquele cativeiro. Nesse momento ela se lembrou das diversas vezes que Daniel utilizou sua aura para aumentar sua força física e pensou que poderia fazer o mesmo! Ela se concentrou e começou a sentir um calor que saia de seu âmago e se espalhava pelo corpo. Sentiu essa energia sobrenatural, que se origina de nossas almas, aumentar sua circulação sanguínea e inflar seus músculos. De mulher mirrada ela se tornou uma amazona musculosa que deixaria uma fisiculturista com inveja. Ela olhou sem muito animo para o próprio corpo e apenas pensou se aquilo seria suficiente contra uma porta de ferro. Ela fechou um punho e bateu com toda a força na porta!

-- Bati! – disse o horripilante cavaleiro de armadura negra ao mostrar suas cartas para seu rival. – Não fique assim Antonius! Não da pra se vencer todas não é mesmo? Nhá nhá nhá nhá nhá! – riu a decrepita criatura enquanto puxava um monte e feijões para perto de si.
O estranho jogo de cartas acontecia em uma mesa de madeira quadrada. Ela tinha uma perna a menos e parava em pé graças a um cabo de vassoura quebrado que substituía a ausente. O cenário era um enorme galpão que poderia estar tanto em um estaleiro quanto em um aeropoto. Mas pelo fato dele ter apenas um contêiner não era sinal dele estar sendo usado por mais ninguém além daqueles dois senhores que poderiam estrelar, cada um, uma franquia própria de filmes de horror.
O que havia acabado de ganhar o jogo de cartas usava uma armadura negra quase completa. Ela não protegia apenas os braços, cochas e abdome. Nessas partes onde ela era ausente era possível ver que a criatura que a vestia era destituída de carne. Um esqueleto animado de um metro e secenta e cinco vestia a armadura que ficava meio desengonçada em seu corpo pela falta de carne para ela se acomodar corretamente.
Seu rival por outro lado tinha bastante carne. Em seus dois metros e vinte de altura Antonius era o que se podia chamar de brucutu de academia. Ele usava uma calça de lutador preta e folgada. Duas botas que eram amarradas na altura dos joelhos e uma camiseta regata branca. Em sua cintura havia um cinturão prateado de campeão de boxe datado de 1921 com o nome Walter H. Liginger. E porque ele poderia estrelar um filme de terror? Pelo simples fato de sua cabeça ser desprovida de pele e de muitos músculos faciais. Foi possível ver seus poucos músculos do rosto se contorcerem de raiva quando o esqueleto de armadura o venceu no jogo de cartas.
-- Ora! Como é possível! Já é a décima vez seguida que você bate Mitrax! Desse jeito acho que eu vou ter que bater em você para o jogo ficar mais interessante! – disse Antonius batendo com um punho na mesa e fazendo-a desmontar no chão com as três pernas e cabo de vassoura quebrados. As cartas se esparramaram pelo piso sujo do galpão e os feijões rolaram para todo lado.
-- Mal perdedor! É isso que você é! – disse Mitrax ficando de pé e enfrentando o gigante, que sentado tinha sua altura, olho no olho. – Se quiser a gente resolveu tudo aqui e agora em um duelo! – disse estendendo sua mão enluvada para Antonius.
Antonius estava tentando esboçar um sorriso e aceitar o duelo mas foi interrompido pelo barulho de uma forte pancada contra uma porta de ferro.
-- Silêncio! – disse Antonius olhando para o contêiner no meio do galpão. Outras três fortes pancadas se seguiram, mas o contêiner nem se abalou com elas.
-- Ah! Não é nada. É só nossa convidada tentando sair. Logo ela desiste e volta a chorar Nhá nhá nhá nhá nhá! – riu Mitrax. – Bom, mas isso me lembrou de nossa missão aqui. Ele vai ficar muito chateado se a gente não fizer com eficiência algo tão pequeno como isso.
-- Tem razão – disse Antonius começando a catar os feijões – posso te confessar uma coisa?
-- Claro – disse Mitrax tentando consertar a mesa.
-- Ele me dá medo!
-- Em mim também!
Disse um corrompido do medo para o outro.

Inútil. Tudo que ela tinha conseguido ao bater na porta foi machucar a mão. Ao bater nas paredes ela rasgou um pouco do papel que a forrava e viu que as paredes eram de aço blindado. Se ela tivesse a força de Drakon, o entai que conseguiu subjugar Drexler em seu torneio, aquelas paredes nada seriam. Mas o que ela estava pensando não é mesmo? Sua única força estava em seus amigos e naquele momento ela estava sem nenhum deles. Não tinha como sair de lá concluiu desanimada.

Dias ou semanas depois ela acordou novamente, comeu um pouco da comida mal preparada se perguntando se não seria melhor parar de comer e morrer logo de uma vez. Já tinha estado em Zênite e aquele lugar não era pior do que essa prisão onde ela era obrigada há passar o tempo todo com ela mesma.
Ao colocar a bandeja vazia perto da porta ela voltou para o canto oposto e ficou abismada que uma peça do cenário tinha finalmente sido alterada. Na verdade um novo elemento tinha sido introduzido. Um livro cuja lombada era da largura de um bloco de concreto e nela estava escrito no idioma de Zênite “O Oráculo”. Ela foi até ele com calma, colocou no meio de sua perna cruzadas, contemplou o rosto de ouro que adornava a capa e tentou abri-lo. Mas assim como a porta daquele lugar o livro parecia fechado. Nem um livro ela conseguia abrir! Pensou antes de começar a chorar e molhar o rosto da capa com suas lágrimas.
-- Por favor, donzela! Pare de chorar! – disse uma voz que ecoava por toda a sala enquanto a boca do rosto do livro se mexia.
-- Ahn? – disse Beatriz espantada enquanto olhava o rosto no livro e o tocava com a ponta dos dedos percebendo que ele se mexia. Era puro metal e mesmo assim se mexia!
-- Isso faz cócegas – disse o livro antes de ser jogado do outro lado da sala por Beatriz.
-- Legal. Finalmente essa sala me deixou louca! Agora estou conversando com um livro!
-- Você deveria tratar os livros com mais cuidado. Ainda mais uma obra de arte como eu.
-- Então você fala mesmo! Nunca vi um artefato como você! Espere! Eu nem despejei minha aura em você para criar uma harmonia entre a gente e ativa-lo. Como está falando?
-- É verdade. Se você tivesse me dado um pouco de sua mana eu deixaria que me abrisse.
-- Mana? – disse Beatriz enquanto pegava o livro e o colocava com cuidado no chão a sua frente
-- Mana, aura, ki, gnose, foco, cosmos, soma, etc. É tudo a mesma coisa. Se quiser podemos continuar conversando, mas sou um livro e ficaria muito grato se me lê-se.
Beatriz olhou intrigada para ele e na única coisa que conseguia pensar era: armadilha.
-- Não obrigada. Se você apareceu aqui é porque quem me capturou quer que eu lhe leia. Posso não destruir portas de ferro com a mão mas não fiquei burra da noite pro dia.
-- Se esse é seu desejo, mas é uma pena já que tenho tanto para lhe mostrar. Se mudar de idéia já sabe como me abrir. Mais de dois mil anos sem falar com ninguém e é assim que sou tratado. Se eu tivesse sentimentos certamente ficaria magoa. Adeus. – finalizou o livro fazendo com que seu rosto voltasse a ficar imóvel.
Definitivamente Beatriz tinha decidido que não leria aquele livro.

Meia hora depois ela estava de joelhos concentrada no livro e descarregando uma porção de sua aura no mesmo. Certamente aquela era uma armadilha. Mas se aquele artefato tivesse o pode de lhe mostrar onde estava Daniel o risco valeria a pena. O livro brilhou dourado ao receber sua aura e suas páginas abriram aleatoriamente. Beatriz olhou suas pequenas letras e começou a leitura.

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